"A Ilha dos Cachorros" (Isle of Dogs, 2018) de Wes Anderson


Acredito que muitos já ouviram falar do cinema de Wes Anderson. Provavelmente, "O Grande Hotel Budapeste" é o primeiro filme que virá a mente de muitos de nós ao ouvir o nome do diretor, afinal o icônico filme foi bastante aclamado e é bastante marcante. Contudo, p primeiro filme que assistir do diretor foi "O Fantástico Sr. Raposo" (2009) durante um evento acadêmico em uma Universidade do Pará. A partir desta animação eu pude ter contato com a famosa simetria tão característica do diretor, os movimentos verticais e horizontais - quase teatrais - de câmera, as narrações em off que evoluem a trama. De imediato eu pensei: "Isso aqui é animação para adultos". É um grande filme.

Após assistir a primeira animação do diretor, meu segundo contato com este foi justamente com o filme sobre o Hotel Budapeste. Não demorou para eu começar a pesquisar sobre o diretor. De fato, ainda não posso dizer que sou um grande conhecedor de sua filmografia, afinal "A ilha dos cachorros", segundo filme de animação do diretor, é o meu terceiro contato com a sua obra.


Lançado e aclamado em Festivais, neste filme Wes Anderson nos traz uma história com seu típico estilo e, a meu ver, muito mais palatável para crianças e  pré-adolescentes, ainda que em geral o filme trate de assuntos muito adultos, e tenha um estilo que as crianças não devam se interessar com muito facilidade. Mas é possível.

Temos, então, uma história sobre uma cidade em que uma doença tem afetado os cães e o governo decide exilá-los em uma ilha, mesmo que haja uma possibilidade de cura. É um governo ditatorial. Um garoto chamado Atari decidi ir até esta ilha atrás de seu cachorro Spots. Na ilha há uma divisão bastante clara entre os cachorros, já que estes também foram criando formas de viver naquele lugar tão selvagem, sujo e precário. Organizações começam a reivindicar direitos aos cachorros e  o governo vai querer eliminar de vez os pobres cachorros.

Todas as características já conhecidas do diretor estão presentes nesse filme, o diferencial está no trato do roteiro e dos seus personagens. Os protagonistas são os cães e você realmente se importa, os entende, tudo nos leva a torcer por eles. Todos eles falam inglês. Porém, a história se passa no Japão. O Atari, como um bom japônes, fala a língua japonesa. Não espere legendas. A maioria dos diálogos dos humanos são em japônes e poucos deles são traduzidos - quando o são geralmente são pela voz de uma personagem tradutora - muitos deles tendo que ser compreendidos pelo contexto. É uma escolha bastante arriscada, mas interessante, pois no universo faz sentido. Contudo, algumas cenas perdem peso quando você não compreende o que está sendo dito, parece menos importante. E acaba que focalizamos apenas na fala dos cachorros mesmo, já que ela é minimamente compreensível.

O filme é bastante atual e traz reflexões muito interessantes sobre regimes totalitários, convívio em sociedade, a forma como propagamos nossas ideias, há um paralelo com a situação dos imigrantes, corrupção, manipulação midiática. Está tudo ali em volta de uma história de amor entre um humano e seu cão.

A animação em stopmotion tem uma elegância inacreditável, além de uma perfeição de fazer os olhos sorrirem. Cada detalhe é muito bem cuidado. Existe algo nesse tipo de animação que a torna, a meu ver, mais interessante, pois é muito mais palpável do que as animações feitas apenas por computação gráfica. Ainda não identifiquei o real motivo de pensar isto. É a mesma reação que eu tenho quando um vejo um filme feito em 2D. Tem uma magia diferente ali.


Durante um filme, existe alguns temas musicais muito recorrentes na trilha sonora que é baseada em sons bastante evocativos da cultura japonesa, muitos tambores, tímpanos, bastante minimalista em muitos aspectos. Algo, porém, saltou aos meus ouvidos. Um tipo de assovio que os cachorros utilizavam para se comunicar e para expressar determinadas coisas sendo tais sons parte, também, da trilha sonora. Constantemente me peguei fazendo uma interligação com a trilha  de "A forma da água", com aquele assovio tão marcante e mágico. Ao fim do filme, durante os créditos, descobrir o porquê da minha relação tão direta: ambas foram criadas pelo mesmo compositor, Alexander Desplat (que ganhou o Oscar na categoria esse ano). É algo muito bom, que dá ritmo a história e ajuda a contá-la.

Assista no idioma original. Scarlett Johansson mais uma vez faz uma excelente atuação com a sua voz. 

Quando chego ao fim do filme, percebo que o estilo do diretor é bastante interessante. E a história é bastante simples em geral, por isso o meu parecer de que ela é minimamente acessível a um público mais infantil, ainda que seja mais relevante ao público adulto. É um filme bom, carente um pouco de emoção. Um tanto confuso em alguns momentos, principalmente quando somos limitados diante do desconhecimento da língua japonesa. Nesses momentos parece que estamos perdendo algo muito importante. Fez falta as legendas. É divertido e muito bem feito. Espero vê-lo nas premiações na categoria de Melhor Animação. Aproveite o filme.



Por Jônatas Amaral




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