[#OSCAR2017] "FENCES" (2016) : Um filme de confrontos


Baseada em uma peça de teatro de 1983 que surpreendeu a muitos e ganhou os maiores prêmios dos palcos norte-americanos, “Fences” teve sua adaptação realizada em 2016 para os cinemas, dirigida por Denzel Washington, e com o mesmo elenco que recentemente realizou a peça na Broadway. Estrelado por Denzel e Viola Davis, temos um filme dramático e tenso retratando como o meio nos molda, nos modifica e nos fere, ou nos faz ser livres. É um filme que fala sobre prisões interiores.

Troy Maxon é um trabalhador da companhia de saneamento, tendo a função de recolher o lixo das pessoas. Seu maior sonho era ser um jogador de baseball, mas por conta de todo o preconceito vigente, não se aceitava ter homens negros nos times. Essa e outras frustrações de sua vida difícil o tornaram um homem ferido e, dependendo do ponto de vista, cruel. Casou-se com Rose (Viola Davis) depois de um período em que enfrentou a criminalidade, a prisão, a fome, o inicio de uma família. Ao lado de Rose, construiu uma família. Teve dois filhos Lyons (Russel Hornsby) e com Rose teve Cory (Jovan Adepo).

O enredo do filme gira em torno da vida de Troy e todas as interações com os personagens coadjuvantes são para enfatizar determinados aspectos da vida deste. Em determinados momentos temos a voz de cada personagem ganhando vida, mas é na tríade Troy-Rose-Cory que o filme emociona e quase chega a chocar. A causa do choque está no texto brilhante de Augusto Wilson. É um texto que te confronta com perguntas e reações que alcançam o fundo da alma. Perguntas e respostas que você nunca pensa em ouvir, e soam quase que cruéis às vezes.

Eu tive a impressão que Troy é o protagonista e o vilão ao mesmo tempo da história. Porém, ao mesmo tempo, podemos refletir que o vilão é o próprio meio, já que a forma com que Troy cria o filho o fere, mas também o amadurece, e que advindo de coisas que ele viveu e experimentou. E é estas construções de personagem que tornam este filme uma preciosidade. Nesta resenha quero destacar três momentos, três cenas que me marcaram para a vida. Darei nomes a elas e provavelmente haverá detalhes da história.

PORQUE NUNCA GOSTOU DE MIM?


Esta é uma pergunta feita por Cory ao pai, e o que mais surpreende nesta cena é a perspectiva de responsabilidade paterna sobre um filho. A resposta de Troy é dura e cruel. Se você ver a reação das pessoas no teatro diante da mesma cena você entende ainda mais, não porque as pessoas ficam chocadas, não. Elas riem, porque acham que é uma piada, mas não é.

Esta é uma cena que está no trailer do filme e já mostra o ideal de pai que Troy têm. E isto se reflete ao longo de toda a interação com o filho ao longo do filme. O pai quer que ele seja alguém, mas não seja como ele. Não viva as mesmas coisas que ele. Contudo, torna as suas vontades e traumas uma prisão ao próprio filho. É como uma vontade excessiva de inserir no filho um respeito que só é conseguido através do medo.

Esta é uma cena que incomoda. 


WHAT ABOUT MY LIFE? (E quanto a minha vida?)


Em determinado momento do filme, Viola Davis detém o seu grande e mais importante momento dentro do filme. Diante das circunstâncias em que ela se descobre repentinamente, depois de uma revelação feita por Troy, Rose ver sua família sendo destruída diante dos seus olhos.

Troy tenta explicar o seu lado da melhor forma possível e temos aqui mais uma vez a dualidade. Você entende Troy, mas não aprovamos de forma alguma sua atitude, as suas palavras. Suas palavras beiram ao ridículo diante da situação, mas são sinceras. Até o ponto de ele colocar para fora o sentimento de estagnação de uma vida, e é então que temos um monólogo forte e intenso que começa com a frase: “Eu fique parada junto com você” e vai alcançando seu ápice com as seguintes frases: “E quanto a minha vida? E quanto a mim?”. É uma cena triste e difícil de assistir, afinal “há pessoas que constroem cercas para manter coisas de fora, mas há outras que constroem cercas para manter as coisas dentro”, Rose é o segundo tipo.

Rose ficou presa no papel de esposa durante 18 anos e tudo o que ela fez foi para manter a felicidade e sua determinação de ter uma família forte e direita.

AGORA É ENTRE EU E VOCÊ... MAS NÃO SERÁ FÁCIL. 

Esta é ultima cena que eu gostaria de destacar. É a ultima cena de Troy. É um confronto final entre pai e filho. É um momento em que Troy está sem moral, sem cor, sem vida. É um momento em que Cory não tem mais qualquer respeito pelo pai, a ponto de dizer que ali o pai não significava mais nada. É mais uma vez, uma cena difícil tanto pela dureza das palavras, quanto pelas reações violentas. É o detalhe final da criação de um homem.

Após esta cena, temos um epílogo belo e sensível, onde tudo é nos dito. E, observamos a grandeza de um homem e tudo aquilo que ele produziu seja de bom ou ruim dentro da vida das pessoas que ele tocou.

É um filme baseado na grandeza de seus personagens e nos seus diálogos. Não é uma obra visual propriamente dita, tudo é dito. Tudo é colocado em palavras. Simbolicamente, as cercas são construídas e destruídas por palavras.

O diretor dinamizou bem as cenas, mas toda a construção cênica e a posição dos atores em cena são bem teatrais. É quase uma peça ganhando vida nos cinemas, tendo o auxilio de tudo o que essa modalidade oferece. É um filme para ter reações e sensações através de inteligentes confrontos verbais.

Por Jônatas Amaral 

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